sexta-feira, 5 de outubro de 2012

À Procura de Diana - O Que Correu Mal



O novo perfume Catch Me, da Cacharel foi concebido para as noites de Verão e é um aroma jovem, divertido e "flirty". Coquette, com oscilações entre os aromas cítricos e os gourmand, a composição olfactiva conta ainda com leite de amêndoas e jasmim, âmbar e madeiras. A campanha publicitária foi criada por Jean-Baptiste Mondino e a modelo é Diana Moldovan. Diana é uma rapariga loira,alta, de olhos azuis e elegante. Nestes últimos dias tem-se gerado algum tumulto à volta deste novo perfume da marca francesa Cacharel, aqui vamos contar a história de Diana e Ricardo.



Dia 15 de Setembro de 2012: foram convocadas várias manifestações por todo o país contra as medidas de austeridade impostas pelo Governo. Ricardo manifestava-se em Lisboa com um grupo de amigos. Quando no Bairro Alto, avistou uma jovem rapariga, alta, loira, com olhos azuis, linda e elegante (adjectivos usados pelo próprio). Após uma troca de olhares entre ambos, criou-se uma ligação, um “clima”. A jovem rapariga afastou-se da manifestação e Ricardo conseguiu ler-lhe nos lábios “Apanha-me”. Este afastou-se do grupo de amigos e foi atrás da jovem desconhecida, encontrando-se com ela num banco do jardim do Príncipe Real. Após longas horas de conversa, a jovem de seu nome Diana, proveniente de França, brinda Ricardo com um beijo e despede-se dizendo que não lhe iria dar qualquer contacto seu, nem telemóvel, Facebook ou morada, e que dia 14 de Outubro voltaria para França, e que até lá, se ele quisesse realmente estar com ela, que fizesse os possíveis para a encontrar.

É assim que começa uma aparentemente bela história de amor como se vêm nos filmes. Já visto antes nas redes sociais, jovens apaixonados que decidem encontrar pessoas que conheceram na noite anterior, Ricardo decide criar uma página na rede social do Facebook intitulada “À procura de Diana”. Durante semanas foram feitos posts nessa página, o jovem estava claramente apaixonado pela francesa. Esta página, cuja imagem era uma fotografia desfocada de Diana de costas, espalhou-se como vírus nas redes sociais, chegando a atingir mais de 21 mil Likes! Recentemente a TVI fez uma reportagem sobre esta história de amor, onde Ricardo aparece explicando a história, relatando os factos e mostrando-se claramente apaixonado e decidido em encontrar Diana.



Até aqui tudo bem, tudo indica que esta história ainda tem muito para durar e tornar-se num belo caso de amor. Contudo há dias, veio a público que esta página existente no Facebook, assim como toda esta história, não passou duma estratégia de marketing digital de guerrilha da marca Cacharel para promover o seu último perfume feminino Catch me. Teoricamente esta estratégia foi inteligente. Mas que na prática não surtiu os efeitos desejados. Já se criaram grupos no Facebook como “À procura da agência que fez a acção À Procura de Diana” ou “Movimento Anti-Cacharel Portugal”. Grupos de pessoas que se sentiram desiludidas e frustradas com a marca.
O que poderia ter sido feito para que esta história tivesse um final feliz? Analisando o vídeo publicitário de Catch me, pode-se ver uma jovem, alta, loira, elegante, tal qual a Diana de Ricardo. Por coincidência a modelo chama-se Diana, que numa atitude de flirt desafia um jovem rapaz para a apanhar, dizendo mesmo “Catch me”. Até aqui, tudo muito similar à história contada por Ricardo na reportagem feita pela TVI.



Páginas do Facebook 
À procura da agência que fez a acção À procura de Diana:
Movimento Anti-Cacharel Portugal:


Esta campanha poderia ter sido muito mais bem planeada. Primeiro, em lado algum se vê a referência à marca Cacharel ou ao perfume em si. Os únicos pormenores que podem ser identificados que podem ser, indiretamente, relacionados com o perfume é o facto de a rapariga se chamar Diana como a modelo (coisa que quase ninguém poderia associar ao nome de uma modelo pouco conhecida em Portugal) e de ela ter dito ao Ricardo “Apanha-me” – Catch me em inglês. Se a rapariga fosse uma turista que não falasse português, e que estivesse em Lisboa de férias e tivesse dito “Catch me” ao jovem, provavelmente já poderia ter alguma ligação mais directa ao perfume. Ricardo andou a espalhar folhas pelos postes e árvores em Lisboa à procura de Diana fornecendo forma de ela, ou alguém que tivesse alguma informação sobre a jovem, poder contactar com ele. Estes mesmos papéis que puderam ser vistos na reportagem da TVI também não forneciam nenhuma pista ou ligação à marca. Por exemplo, os contactos podiam remeter ao site do Catch me?! Seria uma forma mais suave de as pessoas perceberem o que se estava a passar. Esta história, que é digna de comédia romântica, podia ter tido um final feliz, se tivesse também sido prolongada por exemplo até ao dia 14, data em que a jovem voltaria a Paris. Aí se calhar podia ter-se feito um flashmob, ou um pequeno happening que indicasse que isto se tratava duma acção de publicidade.

Esta história vem mexer com alguns valores importantes. A verdade é que quem viu a página supostamente criada por Ricardo, sentiu uma empatia, talvez até tenha sentido uma inveja porque gostaria que tal lhe acontecesse também. Estas mesmas pessoas ao aperceberem-se que isto foi tudo mentira, tudo falso, sentem-se enganadas e traídas por uma marca que podiam não conhecer ou até conheciam e agora deixam de adquirir produtos Cacharel. O objectivo do marketing de guerrilha é, de uma forma inovadora, promover um produto, criando um “buzz”, fazendo com que a marca seja falada. Neste caso a marca é falada mas não pelos melhores motivos. Até que ponto é que uma história de amor com a qual as pessoas se poderiam identificar, mas que no final é falsa, poderia reverter num aumento de compra do perfume? Até que ponto é que o Amor agora não passa a ser mais uma ferramenta de marketing utilizado pelas agências de publicidade? Todas as marcas querem criar ou estabelecer uma relação emocional com o público, mas até que ponto, jogar com os sentimentos deste pode ser uma coisa positiva, no sentido de retorno para a marca? A marca veio cheia de boas intenções, mas como se diz, saiu-lhe o tiro pela culatra.

Noutro nível, esta acção teve repercussões escandalosas, não já para a marca. O jornalismo televisivo e a sua credibilidade foram postos em causa. A TVI fez disto notícia de destaque num dos seus telejornais com uma reportagem que incluiu entrevista ao jovem Ricardo numa das ruas mais sujas e malcheirosas do já decadente Bairro Alto. Na Travessa da Cara, onde ocorreu em 2008 um crime que levou à morte a tiro de um jovem de 22 anos, Ricardo contava a sua pouco glamorosa e forçada história. A TVI acreditou em tudo e serviu o prato aos portugueses provando mais uma vez a precaridade dos jornalistas que contrata. A estção televisiva veio já a público pedir desculpas pela falsa notícia.


Uma nota a título de curiosidade: não teria sido mais inteligente optar por uma rua bonita ou um jardim, algo mais inpirador e fantasioso, factor intrínseco a este tipo de produto?

Na própria página “À procura de Diana” a marca já veio a publico pedir desculpas, como se pode ler a seguir: “Esta acção regeu-se por princípios como o amor, romantismo e todas as emoções. Não foi nossa intenção colocar em causa os valores subjacentes a essa acção, mas sim desenvolver o mote de lançamento do produto. Fomos surpreendidos com a dimensão e impacto que esta história de amor teve, pois não era nossa intenção ferir susceptibilidades”. Nesta mesma página, um pequeno pormenor poderia denunciar à partida todo o esquema. Na verdade, a data de criação da página no Facebook é 12 de Setembro, três dias antes do suposto encontro. Teria sido um caso de futurologia?


Agora falta só saber se este perfume cheira assim tão bem para se terem dado a este trabalho todo.

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